Artigo: Condições indispensáveis para o processo de integração

Por Melissa Martins Casagrande, doutora em Direitos Humanos e Pluralismo Jurídico pela McGill University e professora de Direitos Humanos e Direito Internacional Público na Universidade Positivo

Legitimidade e efetividade são duas palavras-chave, indissociáveis, para que o Direito Internacional cumpra seu papel nas relações entre Estados e, sobretudo, para que gere efeitos positivos para as pessoas que vivem nestes Estados. Tratados celebrados entre Estados, incluindo aqueles celebrados dentre os Estados que compõe uma Organização Internacional, visam a consolidação de parcerias em termos equânimes. Estes tratados são legítimos perante a comunidade internacional e representam as aspirações comuns dos parceiros. No entanto, a efetividade destes tratados, o impacto local deste compromisso conjunto, somente se materializa quando cada uma das partes implementa as garantias propostas no acordo.

Cada acordo representa um compromisso dentre os atuais membros de uma parceria internacional como também representa uma condição essencial para qualquer novo membro. Ao aderir ao Mercosul, cada novo membro se compromete com a incorporação em seu ordenamento jurídico de normas vigentes no bloco, conferindo solidez às garantias estabelecidas em comum acordo. O descumprimento deste compromisso no tempo estipulado compromete a legitimidade do acordo e, principalmente, a efetividade das garantias às pessoas que vivem sob a proteção dos Estados em questão.
Dentre as condições-base para que um Estado integre o Mercosul estão a incorporação solidaria pelos Estados em sua legislação de acordos comuns sobre as mais diversas temáticas, desde normas sobre cooperação técnica, passando por acordos sobre entrada e residência em seu território de nacionais dos outros Estados-parte. Além do déficit de ação coordenada na incorporação de acordos que abrangem as mais diversas searas, a cessação do exercício dos direitos da Venezuela inerentes à condição de Estado-parte do Mercosul tem estreita relação com a função fiduciária de proteção dos Direitos Humanos desempenhada pelo Direito Internacional.
Longe estão os tempos em que a soberania estatal era princípio inegociável. A partir de meados do século XX, sob a sombra das atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial e desde então, o Direito Internacional promove a proteção dos Direitos Humanos de forma universal. A comunidade internacional passa a encorajar a atuação solidária dos Estados pela proteção dos Direitos Humanos e atua subsidiariamente em prol desta mesma proteção. Dentre os acordos não incorporados pela Venezuela ao seu ordenamento jurídico interno está o Protocolo de Assunção sobre o Compromisso com a Proteção e Promoção dos Direitos Humanos do Mercosul. O Protocolo, ao enunciar o compromisso dos Estados-parte do Mercosul entre si e perante suas comunidades nacionais, considera fundamental assegurar a proteção, promoção e garantia dos Direitos Humanos e liberdades fundamentais de todas as pessoas. Asseverando ainda que o usufruto efetivo dos direitos fundamentais é condição indispensável para o processo de integração entre os Estados.
A cessação de direitos inerentes a condição de Estado-parte em uma Organização Internacional é uma sanção aplicada com o objetivo de encorajar o Estado a reavaliar sua posição em todas as frentes. A iniciativa reforça a compreensão de que hoje a harmonização de normas técnicas não são as únicas condições para a fruição dos benefícios de pertencimento a um bloco que há muito deixou de ter o mero objetivo de cooperação econômica. A proteção dos Direitos Humanos, assim como o cumprimento das normas comuns sobre circulação de pessoas, são condições indispensáveis para o efetivo processo de integração.
 

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