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Por Eduardo Faria Silva, doutor em Direito, professor de Direito Constitucional da Universidade Positivo (UP)
A votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff seguiu a tendência de votos anunciada pela base aliada do presidente Temer no Senado Federal. Foram 61 votos a favor do impeachment, 20 contrários e nenhuma abstenção, computando-se, assim, sete votos além dos 54 necessários para o afastamento.
O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, que presidiu a sessão de julgamento, definiu que a votação sobre o afastamento da presidência seria separada da decisão sobre a inabilitação para ocupação de cargos públicos. O procedimento definido por Lewandowski reproduziu o mesmo princípio em relação ao julgamento do ex-presidente Fernando Collor, pois, à época, a renúncia (hoje afastamento) implicou numa votação específica sobre a perda dos direitos políticos.
O resultado da segunda votação não manteve os mesmos números a respeito da decisão sobre o afastamento e se traduziu na manutenção dos direitos políticos de Dilma. Foram 42 votos a favor da inabilitação, 36 contrários e três abstenções, ou seja, não foram atingidos o número mínimo de 54 votos, que corresponde aos 2/3 constitucionalmente exigidos.
O que motivou a diferença nas duas votações? A resposta está na fala do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), segundos antes do voto dos parlamentares. Renan pede a palavra e diz que “afastar a Presidente da República é constitucional. Pode afastar na forma da Constituição e da Democracia? Pode, mas não é da Constituição inabilitar a Presidente da República como consequência do seu afastamento, não. Essa decisão terá que ser tomada aqui, pelo Plenário do Senado Federal”. O senador disse ainda que, “no Nordeste, costumam dizer uma coisa com a qual eu não concordo: além da queda, coice. Nós não podemos deixar de julgar, nós temos que julgar, mas nós não podemos ser maus, desumanos”. Ao concluir, o senador diz que vota pela manutenção dos direitos políticos.
As palavras de Renan foram um sinal verde e um salvo-conduto para os parlamentares da base de Temer, ligados ao senador, decidirem contra a inabilitação de Dilma para ocupar cargos públicos. Do ponto de vista prático, o desfecho gera dois problemas graves para o governo Temer: por um lado, o resultado permite que a ex-presidente participe de processos eleitorais e reforça a sua tese de golpe, pois foi afastada do cargo sem cometer crime; a decisão, por outro, gera uma crise no governo Temer minutos antes da posse.
Os partidos da base aliada – como o PSDB e DEM – sentiram-se traídos no momento da votação. O placar e as falas dos líderes dos dois partidos deixam claro que ambos não sabiam da manobra do PMDB, que resultou apenas no afastamento. Cássio Cunha Lima, líder do PSDB no senado, chegou a afirmar que não iria compor o novo governo.
Considerando que Temer precisa acelerar a sua agenda de votação no Congresso, com amplo apoio parlamentar para medidas impopulares, o resultado apresenta-se como uma fratura política que exigirá uma ação para unificar a base partidária aliada. A ação deve, ainda, buscar a neutralização da oposição, que ganhou argumentos para contestar Temer. Do contrário, a aprovação das reformas do governo enfrentará resistências e o descolamento de partidos importantes da base aliada poderá ocorrer em meados de 2017.
A análise deixa em aberto uma pergunta: quais as razões para o PMDB assumir um risco político de fragmentação da base no momento da confirmação de Temer como presidente? A resposta pode encontrar amparo no julgamento do mandato do deputado Eduardo Cunha, PMDB-RJ, que pode ser cassado em setembro e ter seus direitos políticos mantidos.