Artigo: Enem confirma desigualdade persistente

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Por Daniel Medeiros, Doutor em Educação Histórica pela UFPR e professor do Curso Positivo, de Curitiba (PR)

O Inep divulgou as notas do Enem por escola. Foram quase 15 mil instituições de ensino e mais de um milhão de alunos e alunas. Das cem mais bem posicionadas, 97 são particulares. O Inep incluiu, nos últimos anos, vários deflatores de ranqueamento, como o nível socioeconômico dos estudantes, o tempo no qual eles ficam na escola e o grau de formação dos professores. Some-se a isso o número de alunos matriculados nas sedes: das 20 melhores notas, só uma – o Colégio Santo Agostinho de Belo Horizonte –  tinha mais de  200 alunos matriculados. Diante disso, é possível analisar os resultados, não para destacar “melhores” e “piores”, mas para aprender o que fazer para avançar em uma média que é muito ruim. Sem deixar ninguém para trás. Todos os que não queiram ficar para trás.
E ao lançar esse olhar qualificado pelos filtros destacados pelo INEP, descortina-se uma realidade que, sem dúvida, está longe de ser equalizada: a distância, nos resultados, está claramente associada ao nível socioeconômico elevado, poucos estudantes em sala, maior tempo de permanência na escola e professores mais qualificados. E também parece ser claro que a solução já está explicitada no problema: para melhorar o Ensino Médio, é preciso compensar essas diferenças na escola pública. Ou a distância se manterá. Ou, o que é mais provável, aumentará.
E quais medidas seriam estas? Para compensar a deficiência socioeconômica, escola com aulas em tempo integral. Percebam que é diferente de escola integral. A escola pública precisa é de mais aula, mais assistência aos estudantes, mais exposição aos conteúdos da base curricular, mais tempo junto aos professores, mais atividades, mais leitura (muito mais leitura), mais projetos envolvendo as áreas do conhecimento, mais compreensão da história dessas ciências e de sua interação com o mundo real. E por quê? Para compensar a dificuldade de boa parte dos pais de alunos e alunas de baixa renda em acompanha-los, ajuda-los, incentiva-los. A escola deve suprir essa, que é uma das mais fortes razões da evasão e da repetência: a falta de um ambiente de aprendizado adequado.
Mas há um problema: e professores qualificados para essa tarefa? Hoje há um déficit de quase 300 mil professores na rede pública, na sua grande maioria profissionais das áreas de Ciências da Natureza e Matemática. Como resolver isso? Entendendo a razão pela qual diminui, ano a ano, a opção pelas licenciaturas: salários baixos e pouca valorização social da carreira. É urgente, urgentíssimo, mudar isso. Exemplos no mundo não faltam. É preciso adapta-los e aplica-los. O atual governo, porém, pretende tornar a escola mais “acolhedora”, diminuindo a exposição do estudante aos conteúdos curriculares, permitindo ao jovem “escolher” o que tem mais “aptidão”. Só o número de aspas é suficiente para entender o quanto este argumento não vai ao encontro de uma escola pública com mais qualidade. E o resultado? A distância com o ensino privado vai disparar. Difícil, depois, usar o conceito de “mérito” para justificar as diferenças!
Outro problema: verbas. Se, ao mesmo tempo, o governo federal quer ampliar o ensino em tempo integral e limitar o teto de gastos com a Educação, como a conta vai fechar? Criando ilhas de qualidade em meio ao oceano de ineficiência? Estabelecendo metas para o milênio e entregando resultados no fim dele?
Mais uma questão: os alunos que precisam trabalhar. Como inseri-los no conceito de escola com aulas em tempo integral? Ou quem trabalha deve desistir desse negócio de Ensino Médio? Ou haverá um Ensino Médio “B” para os jovens trabalhadores? A resposta é: verbas para bolsas para alunos arrimos de família ou sem família. Esse é o acolhimento que o Estado precisa garantir.
Enfim. Os resultados do Inep mostram um país que já sabemos decor. Só nos resta aprender como mudá-lo.

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