Por José Pio Martins, economista e reitor da Universidade Positivo
O Produto Interno Bruto (PIB) é a soma dos bens e serviços finais produzidos dentro do país. O termo “bruto” significa tudo que é produzido sem considerar a depreciação do que foi utilizado no caminho, como estradas, ferrovias, prédios, máquinas, equipamentos, móveis e outros bens de capital, que se desgastam sem desaparecer. Em uma fábrica de sapatos, o produto são os calçados produzidos sem descontar o desgaste das máquinas. Tais máquinas um dia terão de ser substituídas, por isso dizemos que elas foram “consumidas” pelos sapatos fabricados durante sua vida útil.
O PIB apareceu pela primeira vez em 1924 para medir a economia dos Estados Unidos. Mais adiante, nos anos 1930, o presidente Franklin Roosevelt encarregou Simon Kuznets de elaborar indicadores mais eficientes sobre a renda e o produto nacional. Nascia ali a metodologia hoje utilizada no mundo inteiro, apesar de o modelo apresentar algumas falhas. Um exemplo: se uma família contrata uma empregada para os trabalhos domésticos, o fato de ser registrada e remunerada faz que o serviço prestado por ela entre no cálculo do PIB. Mas, se a própria mãe faz os trabalhos da casa, isso não entra no PIB.
Outro problema é a dificuldade de somar coisas diferentes. A solução para somar toneladas de cenouras com litros de leite e quantidade de vacinas, por exemplo, é tomar tudo por seu preço de mercado. Nisso reside um problema: se dois homens vão a dois médicos distintos para consulta, o primeiro paga R$ 100 e o segundo paga R$ 350, os dois serviços médicos entram no PIB pela soma dos honorários. Na contabilidade nacional da assistência médica é lançado o valor de R$ 450 e uma distorção é criada, pois, apesar da diferença de preço, os dois serviços são iguais.
Outra questão envolvendo o PIB é seu caráter amoral. O PIB é uma medida do que a nação produz, não importando a razão por que produz. A Inglaterra resolveu incluir nas Contas Nacionais (nome da contabilidade do país) os serviços sexuais oferecidos pelas prostitutas, por uma questão simples. Se alguém vai ao cinema, o serviço de lazer que ele comprou está no PIB. Os serviços vendidos pela Disney estão no cálculo do PIB norte-americano, assim como o preço pago por um torcedor para ver uma partida de futebol também está.
Não há razão para que os serviços sexuais não estejam no cálculo do PIB. É um serviço de lazer, como outro qualquer. O mesmo acontece com as drogas. Se alguém produz e alguém compra, as drogas devem entrar no cálculo do PIB, sem considerações morais ou religiosas. Os que condenam a inclusão desses bens e serviços no PIB estão, como diria o filósofo André Comte-Sponville, fazendo confusão das ordens. O PIB é apenas uma contabilidade, sem considerações morais, religiosas ou legais. As armas produzidas no mundo estão no PIB, ainda que sejam usadas para matar.
Apesar de ter defeitos, o PIB é o melhor indicador da produção de bens e serviços dentro das fronteiras geográficas do país. O crescimento do PIB é a principal condição para melhorar o bem-estar da população e o principal desafio é como fazê-lo crescer regularmente todos os anos a taxas superiores ao crescimento populacional. Se a sociedade decidir que não quer determinadas atividades, como é o caso do sexo e das drogas, a solução não está em deixar de contabilizar tais produtos, uma vez que eles existem, mas conseguir proibi-los e bani-los. Jogar o termômetro no lixo não cura a febre de ninguém.