Como água para chocolate: uma crise na sociedade líquida

Ataques online e perda de reputação: confira a análise sobre a repercussão e a gestão na crise da Cacau Show

*por Carolina Werneck

Consumir o mundo como se consome uma edição de reality show faz parte da experiência de estar vivo na sociedade contemporânea. E isso serve para a vida alheia — vista em fotos e vídeos nas redes sociais — quanto para os escândalos das mais diversas ordens que nos chegam em forma de notícia, com fontes mais ou menos jornalísticas, a depender do tema. O caso mais recente mal completou um mês e já respira por aparelhos, acumulando poeira na pilha das ex-novidades que todos “precisam” acompanhar.

Uma das maiores redes de franquias do Brasil, a Cacau Show estampou as manchetes no fim de maio deste ano com notícias que nenhum assessor de imprensa gostaria de ver seu cliente protagonizar. Acusações de franqueados e ex-franqueados se multiplicaram no Instagram, no TikTok e em jornais de todo o país. As denúncias, que pareciam vir de muitas pessoas, ganharam força e engoliram boa parte do debate público nos primeiros dias. A marca se posicionou em seus perfis nas redes sociais e também criou, em seu site, uma aba exclusiva para o comunicado oficial sobre o assunto.

Poucos dias mais tarde, a participação do CEO da companhia em um episódio do MasterChef Brasil pareceu reacender brevemente a discussão. Alguns internautas apontaram o timing da exibição —  apenas um dia depois da divulgação do comunicado oficial —, enquanto outros aproveitaram a oportunidade para reforçar as acusações, demonstrar apoio aos denunciantes ou simplesmente fazer outras reclamações sobre a marca, sua conduta para com os consumidores, seus preços e  produtos. Embora ainda haja gente falando sobre isso nas publicações da Cacau Show nas redes, o número de menções à crise de imagem foi caindo vertiginosamente, dia após dia.

Do ponto de vista dos manuais de gerenciamento de crise, a companhia não pisou fora da linha, exceto, talvez, pela ligeira demora em se pronunciar no primeiro momento. Depois, ela seguiu corretamente o fluxo adotado por tantas empresas nas crises de imagem dos nossos tempos. Notando que novos temas começavam a dominar o debate público, esperou algum tempo em silêncio, até se sentir à vontade para voltar a dar as caras no mundo digital.

Sete dias após o comunicado no Instagram, a Cacau Show fez uma nova publicação em seu feed, no melhor estilo “vida que segue”. A imagem mostrava um kit dos Ursinhos Carinhosos, composto por bombons e nécessaire. Na legenda, palavras como “amor”, “presente”, “coração” e “carinho”, já que o post se refere ao então muito próximo Dia dos Namorados. Nenhuma nova menção ao episódio —  nem ali, nem nas postagens seguintes —, o que é praxe entre as corporações, já que ninguém quer relembrar possíveis problemas.

Entre chocolates, biscoitinhos e respostas padrão a comentários com reclamações pontuais sobre outros casos de insatisfação, a crise que parecia um tsunami foi se tornando uma marolinha passageira. Está claro, pelo adiantado da hora deste século XXI, que o capitalismo tardio transformou tudo, até mesmo as crises de reputação, em produtos que são consumidos e descartados rapidamente. E se, por um lado, isso é positivo para as marcas, por outro, representa uma perda coletiva. Soluções imediatistas, como o boicote sugerido por alguns, não trazem mudanças estruturais ou reflexões mais profundas sobre possíveis melhorias nos métodos de trabalho e na relação com colaboradores, franqueados, clientes e fornecedores. Uma postura mais assertiva seria cobrar atitudes duradouras, em vez de somente uma resposta rápida para problemas pontuais.

Quando Bauman escreveu seu já surrado — e cada vez mais relevante — Modernidade líquida, na virada do milênio, não poderia desconfiar que seria, ele mesmo, uma vítima do conceito, com seus ditos (e não ditos) sendo vendidos por aí em camisetas, bonés, canecas e outras quinquilharias. Sua análise, contudo, foi visionária: 25 anos depois, cá estamos, mergulhados até os narizes em um mundo em que tudo é líquido e nada dura mais que uma corrida de dedos pela tela do celular. Nem mesmo as crises.

*Carolina Werneck é jornalista, redatora e tradutora com colaborações para veículos como Estadão e Haus e experiência de cinco anos na equipe da Central Press, especializada em reputação.

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