Por Katia Brembatti, professora de Jornalismo na Universidade Positivo, editora no Estadão Verifica e presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
Entre os 200 milhões de técnicos de futebol e médicos que “temos” no país — essa anedota que usamos para dizer que brasileiro se mete a saber sobre assuntos específicos —, mais recentemente acrescentamos a categoria “todo mundo se acha jornalista”. Antes uma atividade relativamente restrita, na época em que o mundo era analógico, agora a função de comunicador está “disponível” para qualquer pessoa que decida se aventurar na área. Essa abertura foi possível por meio da digitalização dos processos comunicacionais: de forma resumida, pelo acesso facilitado aos meios de produção — como um celular que funciona como computador e câmera —, com possibilidades de interações quase infinitas no ambiente da internet.
A plataformização das relações quebrou a quarta parede — expressão usada normalmente no cinema e no teatro para caracterizar o diálogo com o público — na produção de conteúdo informativo. Assim, a comunicação deixou de ser, por premissa, um fluxo apenas do emissor para os receptores, ao multiplicar os produtores e permitir a retroalimentação, com o público podendo interagir com o que é divulgado. Essa democratização trouxe avanços inegáveis, mas também deu um verniz de liberalidade ao surgimento de “entendidos” em comunicação — pessoas que assumem esse papel ou se colocam em condições de “julgar” o trabalho jornalístico.
Hoje, 2 de maio, é celebrado o Dia da Ética — uma data propícia para avaliarmos como andam as nossas relações interpessoais. Aqui, especialmente, como estamos nos comunicando. Vale pontuar duas diferenças básicas: a ética na comunicação, que deve nortear todas as relações humanas — como seres comunicantes que somos —, e a ética profissional, que precisa embasar os conteúdos de interesse públicos divulgados para o público em geral. Jornalistas são pessoas treinadas, que aprendem e discutem as implicações do que publicam. Alguém que tenta substituir o profissional pode até acertar, mas corre mais riscos de cometer imprecisões graves, com consequências. Isso precisa ser considerado.
Jornalistas erram — como quaisquer profissionais. Tentamos não errar e, talvez, estejamos na lista das atividades que mais se preocupam em evitar falhas. Mais um motivo para diferenciar equívocos e fake news, termo que se popularizou de forma inadequada. A palavra “desinformação” se encaixa melhor como forma de apresentar uma narrativa enganosa. Diferentemente dos erros, as fakes buscam, intencionalmente, desinformar. São produzidas com informações falsas ou fora de contexto, para criar uma aparente lógica.
É aqui que vamos retomar a questão da ética nas relações interpessoais. Se você compartilha um conteúdo falso que recebeu pelo WhatsApp, está contribuindo significativamente para ampliar a rede de desinformação. Quem apenas repassa também comete crime, ainda que não tenha sido o responsável por fabricar a fake. O caminho para evitar isso é pensar duas ou mais vezes antes de encaminhar e consultar checagens profissionais. Existem tutoriais simples na internet que mostram, até mesmo para leigos, como identificar informações falsas. Para quem quer vestir a carapuça de jornalista, o primeiro passo é verificar o que publica.