Artigo: A falência da atriz

Por José Pio Martins, economista e reitor da Universidade Positivo

Eu tenho três filhas. Por ver a escola não ensinar às crianças noções de comércio, contratos, finanças e tributos – assuntos que, em seu conjunto, chamo de “educação financeira” –, escrevi dois livros sobre o tema: Educação Financeira ao Alcance de Todos (2004) e Seu Futuro (2011). Embora esses livros tenham sido lançados no mercado, meu objetivo primeiro era deixar para a família orientações sobre finanças pessoais.

Penso voltar ao assunto em novo livro, projeto que venho protelando, mesmo tendo várias anotações espalhadas em rascunhos. Porém, um artigo publicado na edição de 3 de agosto de 2016 da revista Veja me sensibilizou e me instigou a começar a escrever o novo livro. O artigo trata do depoimento da atriz Joana Fomm. Aos 76 anos de idade, ela está desempregada, sem dinheiro, sem patrimônio e, como ela diz, almoçando e jantando empréstimo bancário.
Joana sofre de depressão, conseguiu vencer um câncer e, quando poderia estar gozando a vida escolhendo o que fazer, a atriz vem a público fazer um apelo desesperado por socorro. Joana não é uma atriz qualquer. É estrela de primeira grandeza, protagonizou dezenas de novelas na Rede Globo e trabalhou em filmes de sucesso. Reconhecida, aplaudida, badalada, Joana chega aos 76 anos passando necessidades. O que aconteceu?
A atriz é apenas mais uma entre milhões de pessoas que trabalham durante décadas e chegam à velhice com aposentadoria ínfima, sem emprego, sem renda e sem ativos. Muitos nessa faixa de idade não têm energia nem saúde para trabalhar, e a maioria nem tem oportunidade no mercado. Essas pessoas são vítimas da falta de reservas e/ou ativos de renda para seu sustento. Em geral, são pessoas sem educação financeira que, enquanto trabalhavam, não cuidaram de sua independência.
O depoimento de Joana Fomm é triste e comovente. A atriz teve sucesso, fama e aplauso durante meio século. Trata-se de uma pessoa boa e uma atriz querida, mas que, a julgar pela reportagem, não foi eficiente na gestão das finanças pessoais. O infortúnio que bateu na porta da atriz baterá na porta de milhões de outras pessoas. É o preço de imprevidência financeira.
Quando observo os estacionamentos das empresas e noto o padrão dos automóveis, estou certo de que, entre seus proprietários, muitos chegarão à velhice com aposentadoria mínima, sem reservas, sem renda e sem ativos. São empregados que dependem do trabalho assalariado, muitos deles gastando tudo o que ganham (ou mais) e fazendo dívidas para sustentar um padrão de vida acima de sua renda. Não contam com a hipótese de serem demitidos, de ficarem doentes ou de ficarem desempregados na velhice.
Essa postura é uma fuga da realidade, e é baseada na filosofia do “não quero pensar nisso”. Chamo essas pessoas de a “geração carpe diem” (aproveite o dia), que vivem na base da filosofia “eu quero, eu mereço” e não demonstram preocupação com habilidades em finanças e com o comportamento adequado à conquista de um futuro tranquilo. Pense que você possa estar indo pelo mesmo caminho da atriz. Mas, você não é Joana Fomm, não é famoso nem terá duas páginas da Veja para lançar um grito de socorro.
Se você não é funcionário público com garantia de aposentadoria igual ao salário integral da ativa, é melhor pensar seriamente nesse assunto e aprender com o exemplo de Joana. Um provérbio popular diz que os homens inteligentes aprendem com os erros dos outros, os normais aprendem com os próprios erros, e os estúpidos não aprendem nunca. A escolha é sua!

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